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Foi assim que nos vendiam o cigarro: os anúncios mais absurdos da história


Durante boa parte do século XX, o cigarro foi o rei absoluto do marketing. Antes de ser demonizado pela medicina e pela legislação, foi o centro de algumas das campanhas publicitárias mais brilhantes, sofisticadas, manipuladoras e perigosas da história. Vendia-se com glamour, humor, pseudociência, autoridade médica, feminismo de fachada — ou com machismo escancarado.


As imagens eram impecáveis. A estratégia, perfeita. O objetivo: fazer você fumar. E funcionou. Até deixar de funcionar.


Neste artigo, fazemos um passeio pelos anúncios mais impactantes do cigarro: os mais sexistas, absurdos, escandalosos ou simplesmente criativos até a genialidade. Um testemunho visual de como a publicidade pode influenciar desejos, moldar culturas… e afetar a saúde de milhões de pessoas.


ÍNDICE



1. "Mais médicos fumam Camel do que qualquer outra marca"


Começamos com força. Nas décadas de 1940 e 1950, a Camel lançou uma campanha que mostrava médicos de jaleco branco fumando no consultório, garantindo que "a maioria" preferia a sua marca. Essa série de anúncios é hoje um exemplo claro de publicidade enganosa baseada em falsa autoridade.


"A maioria dos médicos fuma Camel mais do que qualquer outro cigarro" (anos 1960) Publicidade da Camel
"A maioria dos médicos fuma Camel mais do que qualquer outro cigarro" (anos 1960). Publicidade da Camel

A estética era impecável: preto e branco, iluminação bem trabalhada, linguagem técnica. Se o médico fumava, você também podia.


O mais perverso é que, em muitos casos, os médicos realmente fumavam. Não era invenção. Só que ninguém contava o que acontecia nos pulmões deles.


👉 Na Espanha, havia os cigarros balsâmicos antiasmáticos do Dr. Andreu.

"Me curei fumando" (anos 1930) Publicidade dos cigarros balsâmicos do Dr. Andreu
"Me curei fumando" (anos 1930). Publicidade dos cigarros balsâmicos do Dr. Andreu

Este artigo documenta a história do laboratório do Dr. Andreu, incluindo os cigarros balsâmicos, com fotografias e contexto sobre como eram vendidos como um tratamento "terapêutico".




2. Lucky Strike e a magreza como promessa: “Escolha um Lucky em vez de um doce”


Em plena obsessão pelos padrões de beleza magros e esbeltos, a Lucky Strike encontrou a fórmula perfeita: substituir a sobremesa por um cigarro. Assim, em vez de engordar, você emagreceria. Ou pelo menos era isso que dizia a campanha.


Essa mensagem não só era falsa e perigosa, como também explorava uma vulnerabilidade histórica das mulheres: o controle do próprio corpo.


O design gráfico desses anúncios era elegante, sóbrio, bem típico dos anos 30 e 40. Uma estética refinada a serviço de uma mensagem tóxica (literalmente).


“Escolha um Lucky em vez de um doce” (1930–1940) Publicidade de cigarro Lucky Strike
“Escolha um Lucky em vez de um doce” (1930–1940). Publicidade de cigarro Lucky Strike

3. O Marlboro Man: masculinidade, virilidade... e câncer de pulmão


Criado como uma tentativa de dar virilidade a uma marca originalmente feminina, o Marlboro Man se transformou em um dos ícones mais poderosos da publicidade do século XX. Cowboys solitários, cavalos, desertos, poeira e fogo. O imaginário masculino transformado em anúncio.


Durante anos, essa campanha foi um sucesso absoluto. Tanto que vários dos atores que interpretaram o cowboy acabaram morrendo de doenças relacionadas ao tabaco.


O auge da ironia: o emblema da virilidade acabou se tornando símbolo de tragédia.


Robert Norris (1987) Publicidade do Marlboro Man
Robert Norris (1987). Publicidade do Marlboro Man

👉 Aqui você pode ver uma extensa coleção com mais de 62.000 anúncios de tabaco, incluindo campanhas icônicas como a do Marlboro Man: Stanford SRITA.


4. Tipalet e o machismo explícito: “Sopre na cara dela e ela vai te seguir a qualquer lugar”


Um dos anúncios mais ofensivos e sexistas já publicados. Nele, um homem sopra a fumaça do seu cigarro no rosto de uma mulher sorridente, com o slogan:

“Sopre na cara dela e ela vai te seguir a qualquer lugar.”

Mais do que grotesco, é um claro reflexo de como o desejo (e a submissão feminina) foi usado como argumento de venda. Esse tipo de publicidade não apenas normalizava o machismo: ele o celebrava.

O mais triste? Funcionava.


“Sopra na cara dela e ela vai te seguir a qualquer lugar” (1969). Publicidade da Triple Cigarettes
“Sopra na cara dela e ela vai te seguir a qualquer lugar” (1969). Publicidade da Triple Cigarettes

5. Publicidade direcionada a crianças e adolescentes


Durante anos, o tabaco se disfarçou entre desenhos animados, quadrinhos e personagens “amigáveis”. A marca Candy Cigarettes vendia cigarros doces para crianças, imitando os dos adultos. Marcas como Marlboro ou Camel criavam produtos e campanhas visuais que pareciam feitas para menores.


Houve até anúncios com bebês no colo de pais fumantes, ou slogans como:

“Papai precisa ficar tranquilo, por isso fuma!”

A normalização começava desde o berço.


Publicidade da Marlboro (1950)
Publicidade da Marlboro (1950)

6. Virginia Slims e o feminismo manipulado: “You’ve come a long way, baby”


Nos anos 70, com a segunda onda feminista em andamento, as empresas de tabaco viram um novo nicho: as mulheres libertadas. A Virginia Slims lançou campanhas onde fumar era um símbolo de independência, liberdade e poder feminino.


O slogan "Você percorreu um longo caminho, querida" era uma celebração da mulher moderna... que precisava de um cigarro para ser assim.


As imagens eram estilizadas, modernas e empoderadoras... mas a mensagem por trás era a mesma: fume e você alcançará o sucesso.


“Você percorreu um longo caminho, querida” (1968). Publicidade dos cigarros Virginia Slims
“Você percorreu um longo caminho, querida” (1968). Publicidade dos cigarros Virginia Slims

7. Celebridades como isca: Hitchcock, Sinatra, John Wayne


Hollywood foi o grande cúmplice da indústria do tabaco. As estrelas fumavam na tela… e fora dela.

John Wayne, por exemplo, foi o rosto da Camel. Mais tarde, desenvolveria câncer de pulmão. Alfred Hitchcock assinou campanhas para várias marcas. Frank Sinatra fumava tanto quanto cantava. E ninguém se importava.


O culto à fama funcionava melhor do que qualquer argumento racional. Se seu ídolo fazia, você também faria.


John Wayne (1951). Publicidade de cigarros Camel
John Wayne (1951). Publicidade de cigarros Camel

8. Cigarros em hospitais, aviões e escritórios


Antes de o fumo ser reconhecido como um problema de saúde pública, ele fazia parte do cotidiano. Fumava-se em salas de cirurgia, na cabine do piloto, em salas de aula, nos ônibus, até em anúncios de brinquedos…


Alguns comerciais mostravam até enfermeiras e pacientes compartilhando cigarros. Outros celebravam a “liberdade” de fumar em voos intercontinentais. Hoje, isso parece ficção científica. Mas era a realidade.


E tudo isso era impulsionado por campanhas que transformavam o ato de fumar em algo comum e idealizado no dia a dia.


Publicidade de cigarros Benson & Hedges (1974)
Publicidade de cigarros Benson & Hedges (1974)

9. Publicidade subliminar e presença cultural


Embora proibida em muitos países, a publicidade subliminar do tabaco existiu e ainda persiste em formatos disfarçados.


Marcas como Marlboro infiltraram sua estética na Fórmula 1 muito tempo depois da proibição direta. Cores, formas e até logos estilizados mantinham a presença da marca viva, sem precisar mencionar o nome explicitamente.


Publicidade subliminar da Marlboro na Ferrari (década de 1970)
Publicidade subliminar da Marlboro na Ferrari (década de 1970)

O tabaco era onipresente: filmes, séries, capas de discos... e, sobretudo, nas grandes revistas de moda.


10. A estética fotográfica: como se camuflava o perigo


Mais do que a mensagem, o que realmente cativava era a imagem. A fotografia de produto e lifestyle do tabaco foi durante décadas uma escola visual para publicitários e fotógrafos.


Utilizavam técnicas cinematográficas, iluminação dramática, fundos impecáveis e styling milimetricamente calculado. As campanhas da Benson & Hedges, por exemplo, eram surreais, artísticas, misteriosas. Verdadeiras obras visuais que pouco ou nada diziam sobre o produto, mas vendiam puro desejo.


Publicidade de cigarros Benson & Hedges (1972)
Publicidade de cigarros Benson & Hedges (1972)

Bônus: os anúncios mais absurdos (e reais!)


Uma breve lista de pérolas publicitárias que hoje pareceriam uma paródia:

  • “Fume para uma digestão mais fácil”

  • “Fume durante o parto, relaxa o útero”

  • “Fumar é bom para a garganta”

  • “Os bebês também gostam do cheiro do tabaco”

  • “Os esportistas preferem Chesterfield”

Sim, tudo isso foi publicado. Em meios sérios. Com investimento milionário.


Por que funcionaram?


A publicidade do tabaco funcionou porque era sedutora, inteligente e impecavelmente desenhada. Usou todos os recursos à sua disposição: psicologia, cinema, moda, humor, medo e desejo.


Foi um laboratório de testes para criativos, fotógrafos, agências e estúdios. E seu sucesso deixou um legado: muitas das técnicas visuais e narrativas que hoje vemos na publicidade nasceram vendendo cigarros.


Publicidade de cigarros Camel (1963)
Publicidade de cigarros Camel (1963)

Reflexão final: estética perigosa


A história da publicidade do tabaco é a história de uma beleza enganosa. De uma estética perigosa. De como as melhores ideias podem vender o pior se forem colocadas no contexto certo.


Hoje olhamos para esses anúncios com espanto, riso ou horror. Mas também com uma lição clara: a imagem não é inocente. Pode inspirar, pode transformar… ou pode matar.


A OMS deixa isso claro em seu guia sobre marketing e publicidade do tabaco: as estratégias de marketing continuam evoluindo e continuam afetando especialmente os mais jovens.


Neste link, você encontra informações detalhadas sobre como a publicidade do tabaco impacta a saúde pública e as medidas recomendadas para sua regulação.


Este percurso te impactou? Compartilhe ou comente. Porque para entender a publicidade de hoje, é preciso conhecer os excessos de ontem.



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